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O Estado da Indústria

O Estado da Indústria

5 Mai, 2023

Apalpar o pulso ao setor


Depois de um crescimento das exportações superior a 20% no último ano, 2023 começou, como se esperava, mais cauteloso. Abrandamento das principais economias mundiais, aumento da inflação e mesmo alterações dos padrões do consumo são elementos aparentemente distintos, mas que baralham toda e qualquer equação.

Há várias expressões populares que podem ajudar a explicar o momento atual da indústria. Comecemos por “Depois da tempestade (pandemia) a bonança”. Vozes mais sábia aconselham que “Nem tudo o que reluz é ouro”. No final, o que importa: “Um homem prevenido vale por dois”, até porque “Devagar se vai longe”

O período é, de facto, de indefinição. A título de exemplo, de acordo com a associação comercial alemã, no ano passado, uma em cada dez sapatarias fechou na Alemanha, originando um total de 1.500 encerramentos.

Pedro Alves recorda que “os resultados do setor são a soma de muitas realidades diferentes, uma vez que a nossa indústria é muito heterogénea”. Nesse contexto, “2022 foi para a nossa empresa bastante positivo e, mesmo não estando ao nível de anos anteriores à COVID-19, representou para a Cool Gray uma primeira fase de recuperação face às quebras que sentimos em 2020 e 2021, anos da pandemia”.  Para 2023 – adianta o responsável da Cool Gray – “a previsão aponta para um crescimento de 15% face a 2022 e os sinais são claros: no primeiro trimestre já crescemos mais de 20% em relação ao período homólogo, pelo que, apesar de um contexto complexo, não podemos deixar de estar otimistas”.

Pedro Saraiva, por sua vez, considera que “depois de dois anos de folia, espera-se que este ano de 2023 seja um ano de maior tranquilidade”. O responsável comercial da Bolflex adianta que “as vendas globais, sobretudo na Europa e nos EUA devem de estabilizar nos próximos três anos, após este período de volatilidade alimentada pela pandemia, pela guerra e pelas pressões económicas, entretanto em movimento. Não é alheio, também, o aumento moderado dos preços no retalho, como causa desta desaceleração”.
 
Em resultado, Pedro Saraiva considera que “o consumidor final procurará maximizar a versatilidade das suas compras de calçado, aliando a esta a eliminação dos custos desnecessários acessórios, apostando sobretudo em calçado com alguma qualidade, para uso diário e casual, com aparente durabilidade, conforto e alguma tendência”. Feitas as contas, “no ato de compra, a quantidade será privilegiada em detrimento da qualidade”, pelo que, previsivelmente, “os artigos com grandes tiragens, das grandes marcas e cadeias globais continuarão a ser produzidos na Asia em virtude do fator preço”. Já em Portugal, “este será um ano de redefinição, sendo expectável que as tendências de venda e os preços estabilizem”.

Já José Machado reconhece que “as encomendas escasseiam” desde o início do ano, “certamente pelos stocks acumulados pelos clientes nos últimos meses”, mas também pelo conflito na Ucrânia que se teima em manter. Para o Diretor Geral da Macosmi “também a escalada de salários que se prevê para os próximos três anos em Portugal, levará a alguns clientes a procurar mercados emergentes no Leste da Europa como Albânia e Lituânia”. A alternativa para Portugal passa por “procurar nichos de mercados” menos sensíveis ao fator preço.

Os constrangimentos
Depois de dois anos de contenção, em virtude da pandemia, 2022 foi um ano expansionista.

“As incertezas macroeconómicas trazem-nos desafios de gestão diária, com oscilações dos preços das matérias-primas, aumentos de custos fixos entre outras preocupações”, lamenta Pedro Saraiva. O responsável comercial da Bolflex aponta uma solução: “uma gestão empresarial cada vez mais rigorosa e sustentada”. A outro nível, “tem de haver um investimento constante em tecnologias, bem como o acompanhamento das novas políticas sustentáveis e no acompanhamento da vida diária da comunidade”. No caso da Bolflex “a I&D é uma preocupação fundamental, o motor da nossa catividade”, pelo que “dominar as novas tecnologias será fundamental na indústria do calçado nos próximos 5 anos”.
 
Já de acordo com Pedro Alves, assiste-se “ao longo dos últimos meses ao aumento significativo dos custos de matérias-primas”, ao qual acresce “o aumento dos custos de produção via aumento dos custos laborais bem como os custos energéticos, fiscais e de financiamento”, pelo que o momento atual é de “alguma turbulência”. “O nosso setor vive melhor com previsibilidade e estabilidade e, nesse sentido, o contexto atual é de facto uma dificuldade acrescida”, apontou o responsável da Cool Gray.
 
 
Os argumentos competitivos
“Fiabilidade nos processos, consistência no serviço ao cliente, ciclos produtivos curtos e um nível de responsabilidade social e ambiental cada vez mais importante e valorizado pelos clientes do “Made in Portugal” serão incontornáveis para o futuro da nossa indústria, considera Pedro Alves. Já o homem da Bolflex destaca que “as empresas estão abertas à inovação e à indústria 4.0 bem como ao apelo da sustentabilidade e possuem uma rápida capacidade de adaptação e resposta”. Acresce que “apresentando já um nível de maturidade sobejamente reconhecido pelos parceiros internacionais, “a indústria portuguesa do calçado deverá igualmente “aliando uma relação qualidade-preço bastante competitiva a capacidade para executar novos projetos”.
 
 
Mudança nos padrões de consumo
Depois de praticamente uma década de boom do calçado com perfil desportivo, nos últimos meses assiste-se, nos próximos palcos mundiais do regresso a modelos mais clássicos e, de certo modo, mais conservadores.
 
“Mais do que nos adaptarmos às grandes tendências de moda, que são por definição passageiras, o grande desafio que enfrentamos passa por nos consolidarmos como produtores de referência para produtos, clientes e mesmo mercados de maior valor acrescentado, seja por via inovação tecnológica, seja por upgrade em design ou função”, considera Pedro Alves. O responsável da Cool Gray vaticina que “os produtos mais básicos têm os seus dias contados ou porque as cadeias de fornecimento asiáticas vão normalizando, ou porque produtores como a Turquia, com evidentes vantagens de custos e de maior proximidade, vão assumindo esse papel”.
 
Pedro Saraiva, por seu turno, destaca que “a confusão entre produtos de moda e calçado desportivo continuará a fazer parte da equação”.  Nos últimos dois anos “o calçado desportivo foi o maior impulsionador do crescimento”, uma vez que “apesar dos eventos sociais voltarem a ser uma realidade e de ocorrer um ligeiro incremento na solicitação de calçado social, tais valores estão ainda abaixo do período pré-pandemia e não se pode afirmar como sendo uma tendência consolidada”. O diretor comercial da Bolflex admite que “as necessidades de reposição de stocks estão a diminuir”, pelo que “ao que tudo indica, o mercado está projetado para permanecer estável, abaixo de 2022”.
 
As novas prioridades
“A promoção externa da indústria portuguesa do calçado sempre teve as feiras internacionais como uma forte componente de promoção”, considera Pedro Alves, já que “o abandono deste meio de promoção por uma grande parte dos players tem as suas razões bem fundamentadas. Quem precisa de estar num qualquer local, durante uma semana, deslocado alguns milhares de quilómetros, com todos os custos acessórios, quando pode ter reuniões virtuais personalizadas?”, questiona. Pedro Alves sublinha que “a pandemia foi um contribuinte-chave desse movimento”, obrigando as empresas “a experiências digitais, imersivas ou não, que suplantaram o antigo circuito de Feiras, transportando isso para os dias de hoje como hábitos e metodologias de trabalho”. Ainda assim, “as feiras voltarão a ser lugares de descoberta para profissionais comprometidos que querem realmente fazer a diferença na indústria”. A outro nível, “as redes sociais e outro tipo de ferramentas virtuais desempenharão um papel gradualmente mais importante”, de forma que “o ataque aos mercados tem de ser feito tendo em consideração a dicotomia entre a reformulação do novo contacto com os clientes e os meios digitais em constante evolução”.

José Machado defende que importa “dotar as empresas de meios de gestão mais eficientes, pois a sucessão começa a ser uma preocupação elevada para o nosso setor”. A Outro novel, “investir tecnologia robotizada, criar centros de formação profissional de forma a preparar os jovens para este setor e encontrar alternativas para à área do corte” são igualmente muito relevantes.
Ainda assim, lamenta que a falta de aposta na marca própria em Portugal. “Embora consigamos manter um Made in Portugal com força, perdemos claramente para Itália no que se refere à visibilidade das nossas marcas”. Por esse motivo, entende ser o momento de “atacar os mercados”. “É preciso mudar a estratégia”, admite.

Novos rumos
“Portugal apresenta um excelente equilíbrio entre capacidade técnica e tecnológica instalada, qualidade e tradição do saber-fazer, proximidade física aos mercados e consistência dos produtos”, considera Pedro Alves. “Podemos ser um destino racional para produções de gama média e alta na Europa e Reino Unido, EUA e Canadá, Japão e Coreia do Sul, bem como no Médio-Oriente”.
 
Pedro Saraiva, por seu turno, considera que “os mercados tradicionais não devem ser descurados, em especial os mercados de proximidade, onde o nosso know-how é bem apreciado”. Já as investidas “fora dos mercados tradicionais devem de ser bem equacionadas pois não é altura para dar passos em falso”.
 
 

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