Entrevista a Luís Onofre, reeleito Presidente da APICCAPS
Luís Onofre acaba de ser reeleito Presidente da APICCAPS, naquele que designa como um dos “períodos mais difíceis da indústria portuguesa de calçado”. Esse foi o ponto de partida para uma grande entrevista ao Jornal da APICCAPS, onde todos os mais importantes temas da atualidade foram abordados.
Luís, foi recentemente, eleito para um novo mandato na APICCAPS. Porque decidiu recandidatar-se?
Há três anos fui eleito pela primeira vez para a presidência da APICCAPS. Nesse momento, a Direção que me acompanhava definiu um programa de trabalhos exigente e detalhado. Terminamos o mandato com o sentimento de dever cumprido.
No entanto, a indústria portuguesa do calçado está a viver um dos períodos mais difíceis da sua história. Aceitei, por isso, candidatar-me para um novo mandato e agradeço, desde já, a confiança de todos, a começar pela Direção que me acompanha.
Luís, foi recentemente, eleito para um novo mandato na APICCAPS. Porque decidiu recandidatar-se?
Há três anos fui eleito pela primeira vez para a presidência da APICCAPS. Nesse momento, a Direção que me acompanhava definiu um programa de trabalhos exigente e detalhado. Terminamos o mandato com o sentimento de dever cumprido.
No entanto, a indústria portuguesa do calçado está a viver um dos períodos mais difíceis da sua história. Aceitei, por isso, candidatar-me para um novo mandato e agradeço, desde já, a confiança de todos, a começar pela Direção que me acompanha.
Não poderíamos abandonar este projeto num momento particularmente complexo. Partimos para este novo mandato com total consciência do que está verdadeiramente em causa.
Há pouco afirmou que a indústria vive um dos períodos mais difíceis da sua história. Com o é que o setor está a reagir?
A pandemia esmagou o mundo de forma global e implacável e teve um impacto que só se conhecia em tempos de guerra, levando a uma quebra drástica na procura e a graves perturbações nas nossas cadeias de abastecimento. Enfrentamos agora, e enfrentaremos nos próximos tempos, um período de transição muito exigente, com incertezas a todos os níveis.
No entanto, é preciso reconhecer que, mesmo antes da pandemia, o mercado internacional do calçado estava já em profunda transformação, passando por alterações nos hábitos de consumo, assim como na afirmação de novos modelos de negócio que estão claramente ligados a novas tecnologias e ao mundo digital.
Todas estas mudanças súbitas têm-nos obrigado a questionar muito do que estamos habituados a fazer. Acredito, mais do que nunca, que é preciso unir esforços e reinventar formas de manter a nossa indústria viva e saudável.
A pandemia esmagou o mundo de forma global e implacável e teve um impacto que só se conhecia em tempos de guerra, levando a uma quebra drástica na procura e a graves perturbações nas nossas cadeias de abastecimento. Enfrentamos agora, e enfrentaremos nos próximos tempos, um período de transição muito exigente, com incertezas a todos os níveis.
No entanto, é preciso reconhecer que, mesmo antes da pandemia, o mercado internacional do calçado estava já em profunda transformação, passando por alterações nos hábitos de consumo, assim como na afirmação de novos modelos de negócio que estão claramente ligados a novas tecnologias e ao mundo digital.
Todas estas mudanças súbitas têm-nos obrigado a questionar muito do que estamos habituados a fazer. Acredito, mais do que nunca, que é preciso unir esforços e reinventar formas de manter a nossa indústria viva e saudável.
“Será exigido a cada um de nós um esforço adicional”
O que é que o setor, como um todo, precisa de fazer para reerguer?
Podemos orgulhar-nos do que conseguimos nas últimas décadas. O sucesso que o calçado português alcançou é mérito nosso. Mas, vamos ter de fazer muito mais e fazer ainda melhor para que daqui a dez, daqui a vinte anos possamos continuar a dizer o mesmo.
Como poucas indústrias podemos dizer que somos um Cluster. A APICCAPS abrange não apenas a indústria do calçado, mas também os artigos de pele, os componentes, os equipamentos ou as empresas comercias. É este trabalho em conjunto que nos dá força.
A integração no Cluster de recursos humanos mais qualificados é um grande imperativo. Teremos de ser capazes, também, de atrair uma nova geração de talentos para as nossas empresas.
De igual modo, precisar de reforçar de forma muito substancial a presença do setor nos mercados internacionais. A qualidade dos nossos produtos tem de atingir patamares superiores para que possamos chegar aos mais exigentes mercados internacionais, lado a lado com os melhores. Não nos podemos resignar a ser os segundos melhores. Temos de ter produtos tão bons como os melhores e temos de os saber promover intensamente. O investimento na promoção internacional continua a constituir um grande desafio. Urge assegurar que Portugal tome a liderança internacional através de um aumento, como jamais aconteceu, do investimento em marketing e promoção externa, quer no plano institucional quer ao nível das empresas.
O terceiro imperativo é a inovação. Neste momento, a saúde é a preocupação fundamental, quase exclusiva, de todos, quer dos consumidores, quer de nós próprios. Mas a pandemia não vai durar para sempre. Algum dia – esperemos que em breve – os consumidores vão voltar a pensar noutras coisas. Tudo indica que a sustentabilidade, para que temos vindo a mobilizar o cluster, estará entre as suas preocupações fundamentais, ainda mais do que antes. Temos de nos preparar, para estar na liderança mundial, no desenvolvimento de soluções sustentáveis. E temos também de trabalhar intensamente o tema da digitalização, para responder às transformações em curso na distribuição e retalho de calçado.
Acredito que é possível alcançar esta meta. Se todos juntos nos focarmos mais na procura de soluções, do que a lamentar os problemas que são reais, globais, difíceis, mas terão com certeza solução.
Uma das grandes limitações atuais passa pela dificuldade de viajar e de se contactar com os clientes. A própria participação em feiras internacionais está hoje altamente condicionada. Isso não o preocupa?
Preocupa-me naturalmente, seja como empresário ou líder associativo. É uma contingência dos nossos tempos.
Par um setor com as características do calçado, a participação em feiras internacionais sempre se revelou da maior importância. Permite-nos contactar com os clientes, testar novos produtos, perceber a dinâmica dos mercados e mesmo aprofundar os conhecimentos relacionados com as tendências de consumo e mesmo dos nossos concorrentes. Vamos ter de rapidamente voltar a essa dinâmica. A esse propósito, a majoração dos apoios à internacionalização, neste momento singular que vivemos, é da maior importância. Temos procurado sensibilizar o Governo para isso.
De igual modo, precisar de reforçar de forma muito substancial a presença do setor nos mercados internacionais. A qualidade dos nossos produtos tem de atingir patamares superiores para que possamos chegar aos mais exigentes mercados internacionais, lado a lado com os melhores. Não nos podemos resignar a ser os segundos melhores. Temos de ter produtos tão bons como os melhores e temos de os saber promover intensamente. O investimento na promoção internacional continua a constituir um grande desafio. Urge assegurar que Portugal tome a liderança internacional através de um aumento, como jamais aconteceu, do investimento em marketing e promoção externa, quer no plano institucional quer ao nível das empresas.
O terceiro imperativo é a inovação. Neste momento, a saúde é a preocupação fundamental, quase exclusiva, de todos, quer dos consumidores, quer de nós próprios. Mas a pandemia não vai durar para sempre. Algum dia – esperemos que em breve – os consumidores vão voltar a pensar noutras coisas. Tudo indica que a sustentabilidade, para que temos vindo a mobilizar o cluster, estará entre as suas preocupações fundamentais, ainda mais do que antes. Temos de nos preparar, para estar na liderança mundial, no desenvolvimento de soluções sustentáveis. E temos também de trabalhar intensamente o tema da digitalização, para responder às transformações em curso na distribuição e retalho de calçado.
Acredito que é possível alcançar esta meta. Se todos juntos nos focarmos mais na procura de soluções, do que a lamentar os problemas que são reais, globais, difíceis, mas terão com certeza solução.
Uma das grandes limitações atuais passa pela dificuldade de viajar e de se contactar com os clientes. A própria participação em feiras internacionais está hoje altamente condicionada. Isso não o preocupa?
Preocupa-me naturalmente, seja como empresário ou líder associativo. É uma contingência dos nossos tempos.
Par um setor com as características do calçado, a participação em feiras internacionais sempre se revelou da maior importância. Permite-nos contactar com os clientes, testar novos produtos, perceber a dinâmica dos mercados e mesmo aprofundar os conhecimentos relacionados com as tendências de consumo e mesmo dos nossos concorrentes. Vamos ter de rapidamente voltar a essa dinâmica. A esse propósito, a majoração dos apoios à internacionalização, neste momento singular que vivemos, é da maior importância. Temos procurado sensibilizar o Governo para isso.
Mas, também, teremos de saber promover os nossos produtos e contactar com os clientes através de outras vias. A APICCAPS tem insistido muito na valorização da nossa oferta. Continuam-nos a faltar marcas portuguesas conhecidas no mundo todo. Esse é, aliás, um problema comum à esmagadora maioria dos nossos setores de atividade. Teremos, igualmente, de reformular de forma muito expressiva a nossa participação online. A APICCAPS está a fazer um trabalho importante nesse domínio.
Vivemos um momento excecional da nossa existência. O Governo tem estado à altura?
É por demais evidente que os últimos meses foram extremamente exigentes. Temos mantido um diálogo constante com o Governo e, em particular, com o Senhor Ministro de Estado e da Economia, que acolheu mesmo algumas das nossas propostas.
Não sente que as empresas ficam muitas vezes na expectativa relativamente a alguns desses contactos que a Associação vai mantendo ao mais alto nível?
A função da APICCAPS é a defesa dos legítimos interesses das suas empresas. Não nos compete tornar públicas conversas e reivindicações privadas. Essa postura da Associação, que não é de hoje, tem-nos permitido construir uma relação de confiança. Foi, aliás, através de uma relação próxima e construtiva que vimos acolhidas algumas das nossas propostas efetuadas no passado recente ao Governo, como as linhas de crédito, o layoff simplificado, os apoios à formação, os seguros de crédito, ou as moratórias dos crédito bancários.
Naturalmente que ainda há muito a fazer e que procuraremos sempre melhorar o que fomos discutindo. Agora, dificilmente resolveremos os nossos problemas falando alto ou tendo uma postura agressiva. Pelo contrário, as nossas propostas procuram ter sempre uma fundamentação técnica inquestionável. Só assim é possível construir.
Quais desses instrumentos que o Governo colocou à disposição das empresas são, na sua opinião, passiveis de ser melhorados?
Eu diria que todos. Mas priorizarei dois. As empresas irão continuar a precisar de estímulos à retoma da atividade. O layoff simplificado é uma excelente medida de gestão e continuará a ser necessário.
Também os seguros de crédito são indispensáveis à nossa atividade. O Governo fez um esforço para encontrar melhores soluções, mas a verdade é que os instrumentos que temos à nossa disposição não são eficientes. É uma prioridade absoluta.
Tivemos recentemente boas notícias vindas de Bruxelas com o acordo sobre o plano de recuperação económica. Que expectativas tem quanto ao próximo Quadro Comentário de Apoio?
Não podemos deixar de saudar o poder de fogo singular que a Europa finalmente conseguiu reunir neste momento difícil.
A Europa tem também de aproveitar este momento difícil para redefinir algumas posições. Ao longo das últimas décadas o vestuário e o calçado foram em Bruxelas vistos como sectores menos importantes. Já chega.
A APICCAPS sempre defendeu um comércio livre, justo e equilibrado. Mas neste momento, a Europa permite a entrada de calçado no seu espaço de dez dos vinte maiores produtores mundiais em condições especiais, isto, por se tratarem de países supostamente menos desenvolvidos. Ora, não faz sentido facilitar a entrada no nosso mercado a competidores que, em muitos dos casos, não cumprem as nossas exigentes regras ambientais e sociais. Por isso, A APICCAPS e a Confederação Europeia do Calçado têm trabalhado em conjunto para alterar o Sistema de Preferências Generalizadas da União Europeia. Trabalho esse que não tem sido fácil como podem imaginar.
Naturalmente que ainda há muito a fazer e que procuraremos sempre melhorar o que fomos discutindo. Agora, dificilmente resolveremos os nossos problemas falando alto ou tendo uma postura agressiva. Pelo contrário, as nossas propostas procuram ter sempre uma fundamentação técnica inquestionável. Só assim é possível construir.
Quais desses instrumentos que o Governo colocou à disposição das empresas são, na sua opinião, passiveis de ser melhorados?
Eu diria que todos. Mas priorizarei dois. As empresas irão continuar a precisar de estímulos à retoma da atividade. O layoff simplificado é uma excelente medida de gestão e continuará a ser necessário.
Também os seguros de crédito são indispensáveis à nossa atividade. O Governo fez um esforço para encontrar melhores soluções, mas a verdade é que os instrumentos que temos à nossa disposição não são eficientes. É uma prioridade absoluta.
Tivemos recentemente boas notícias vindas de Bruxelas com o acordo sobre o plano de recuperação económica. Que expectativas tem quanto ao próximo Quadro Comentário de Apoio?
Não podemos deixar de saudar o poder de fogo singular que a Europa finalmente conseguiu reunir neste momento difícil.
A Europa tem também de aproveitar este momento difícil para redefinir algumas posições. Ao longo das últimas décadas o vestuário e o calçado foram em Bruxelas vistos como sectores menos importantes. Já chega.
A APICCAPS sempre defendeu um comércio livre, justo e equilibrado. Mas neste momento, a Europa permite a entrada de calçado no seu espaço de dez dos vinte maiores produtores mundiais em condições especiais, isto, por se tratarem de países supostamente menos desenvolvidos. Ora, não faz sentido facilitar a entrada no nosso mercado a competidores que, em muitos dos casos, não cumprem as nossas exigentes regras ambientais e sociais. Por isso, A APICCAPS e a Confederação Europeia do Calçado têm trabalhado em conjunto para alterar o Sistema de Preferências Generalizadas da União Europeia. Trabalho esse que não tem sido fácil como podem imaginar.
É essa a sua grande luta na liderança da Confederação Europeia da Indústria de Calçado?
Importa dizer que o simples facto de ser Presidente da Confederação Europeia diz bem do reconhecimento que a nossa indústria conquistou.
Importa dizer que o simples facto de ser Presidente da Confederação Europeia diz bem do reconhecimento que a nossa indústria conquistou.
E sim, deve ser a nossa grande luta. Mesmo enfrentando esta concorrência desleal, incrivelmente os setores da moda são dos poucos em que a Europa ainda consegue ter uma capacidade de liderança mundial. Mas não poderemos continuar, eternamente, a ser os parentes-pobres da Europa. Não nos resignáramos com isso. Na fileira da moda a Europa emprega mais de dois milhões de pessoas.
O ano de 2020 está perdido? Como será 2021?
As estimativas apontam para que este ano se verifique uma quebra do consumo mundial de calçado na ordem dos 22,5%. Na Europa, a quebra ainda é mais expressiva, na ordem dos 27,5%. Deixarão de ser comercializados, em todo o mundo, mais de cinco mil milhões de pares de calçado.
Os próximos tempos não serão fáceis. Será exigido a cada um de nós um esforço adicional e as nossas empresas terão de ser capazes de apresentar soluções inovadoras. Este não é um momento de desistir. É agora, mais do que nunca, que devemos todos olhar em frente com a cabeça bem levantada, com plena confiança nas nossas capacidades, procurando desbravar novos caminhos.
Somos um setor de gente resiliente que sempre enfrentou desafios e lutas. Esta é mais uma e certamente saberemos dar a volta por cima, como sempre o fizemos.
Teme que a economia mundial volte a parar, por via de um novo surto, e seja necessário implementar um novo confinamento?
Isso não me passa pela cabeça. Não sabemos como irá evoluir a pandemia e ainda estão por apurar ,com detalhe, as suas consequências. Agora, não aguentamos um novo confinamento. Aliás, ninguém aguentará. Só mesmo as empresas farmacêuticas e os psicólogos.