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Diário de um confinamento: Orlando Soares

Diário de um confinamento: Orlando Soares

13 Jan, 2021

Começa hoje a nova rubrica: diário de um confinamento


A APICCAPS começa, hoje, uma nova rubrica na Newsletter Diária. Diário de um Confinamento consiste num conjunto de entrevistas a empresários, de modo a “apalpar o pulso” ao setor, enquanto se mede, igualmente, as consequências da pandemia no quotidiano.

Orlando Soares é um empresário de referência no setor de artigos de pele e marroquinaria. Defende que os negócios ainda vão piorar antes de se iniciar uma recuperação efetiva. Sente falta de viajar e dos contactos mais próximos.


No ano que findou, as empresas foram testadas ao limite. Que soluções encontrou para minimizar os efeitos da pandemia?
Procuramos desenvolver várias medidas. A nível comercial, considerando a nossa tipologia de artigo (“slow fashion”), a nossa estratégia baseou-se em garantir stock disponível no imediato aos retalhistas e/ou distribuidores das nossas marcas. A grande razão foi a constatação de que os clientes retalhistas e distribuidores não queriam assumir compromissos de encomendas a prazo logo, a ideia foi dizer-lhes “estamos prontos com stock para quando for preciso” para estarmos na linha da frente na retoma.

No que diz respeito aos clientes “private label” flexibilizámos um pouco as condições nomeadamente em termos de MOQ - mininum order quantity - e aumentámos ligeiramente os prazos de pagamento. Não adotámos políticas de redução de preços.

Adicionalmente reforçámos muito a aposta nas vendas online via loja própria e plataformas já existentes com relevância em Portugal e no estrangeiro

Adotámos, igualmente, vários procedimentos que compensam parcialmente a falta de  contacto presencial nomeadamente com recurso a catálogos digitais interactivos e reuniões periódicas com clientes via Zoom/Teams entre outros.

A nível financeiro, recorremos às moratórias e às Linhas de Crédito COVID. A nível dos quadros da empresa, recorremos ao Lay-Off Simplificado e ao sucessor “Apoio Extraordinário à Retoma”.
 
Que avaliação faz às medidas apresentadas pelo Governo?
Como positivo registamos as Moratórias e o Lay-Off Simplificado. Como negativo registamos alguma falta de visão a longo prazo da situação da maioria das empresas.

Não foi dada a devida relevância ao facto de a ajuda dada às empresas ter passado quase exclusivamente por “mais endividamento”.

Se é um facto unanimemente aceite que as empresas portuguesas estão demasiado endividadas e com um nível de Capitais Próprios muito baixo (existe em Portugal a noção que a única fonte de financiamento é a banca – o que é um fenómeno quase único na Europa), a solução para uma situação catastrófica como esta não poderia passar exclusivamente por mais “endividamento”, nomeadamente para empresas já no limite de endividamento.

Deveriam ter-se considerado fontes alternativas de ajuda e financiamento às empresas, soluções mais estáveis e mais saudáveis e acima de tudo que não comprometessem a capacidade de investimento das empresas e dos setores.

Porque se as empresas portuguesas estiverem sem investir durante 4 ou 5 anos para pagar o endividamento excessivo agora assumido, daqui a 10 anos haverá setores inteiros que vão desaparecer pois não estarão à altura das exigências do mercado pois só uma continua capacidade de investimento das empresas lhes assegura a competitividade e o sucesso futuros

Nas medidas até agora tomadas não se vislumbrou essa preocupação o que constitui um grave erro estratégico e que pode custar muito caro ao país no futuro

Que expectativas tem para o ano de 2021?
Na empresa assumimos que haverá uma melhoria palpável a partir do Verão em termos globais.
No 1º semestre pensamos que as coisas vão piorar e provavelmente atingir o pico depressivo desta pandemia – pelo menos em termos sanitários o que inibe uma boa parte da atividade económica, nomeadamente o mercado retalhista.
Ou seja, pensamos que a situação vai piorar antes de melhorar - embora no caso particular da nossa empresa tenhamos assegurado um bom 1º trimestre as perspetivas para os meses subsequentes são más.
 
O que tem a indústria portuguesa para oferecer aos seus clientes?
Proximidade (no caso da Europa, qualidade, flexibilidade (resposta rápida, quantidades mínimas baixas, grande portfolio técnico) e confiança (baseada em qualidade técnica e sanitária)
 
Este ano, o nosso país começa a beneficiar de um pacote extraordinário de medidas de apoio, a famosa «bazuca europeia». Que expectativas tem relativamente a esse pacote de medidas?
Os valores globais são muito elevados e podem proporcionar uma oportunidade única para revitalizar as empresas e com isso a economia do país – os princípios definidos parecem coerentes e claros mas mais uma vez a grande questão passa por saber se vai haver medidas realmente alternativas ao habitual “mais financiamento, mais endividamento, menos capacidade de investimento, mais endividamento…. “

Os valores dedicados às empresas parecem menores do que deveriam ser considerando que as empresas são o grande motor da economia. O investimento publico é necessário mas se a “bazuca” se esgotar em investimento publico nada irá mudar estruturalmente no tecido industrial e poderá ser uma oportunidade perdida.

Em resumo, deverá haver uma aposta clara e indiscutível na industrialização do país, criando condições reais para que empresas industriais assumissem a liderança da recuperação económica. O Turismo e a Construção Civil/Investimento Publico têm sido tradicionalmente as áreas privilegiadas na atribuição de Fundos Comunitários e nunca houve uma real aposta na industrialização do país.
Se nada se alterar com a chegada da “bazuca”, ficaremos mais uma vez a olhar para países como a Alemanha ou a Bélgica, sempre muito admirados com o sucesso desses países não relevando que a base das suas economias saudáveis é a forte industrialização.

Como exemplo negativo podemos pensar na Grécia que ainda não recuperou da crise da “troika” porque a economia grega não teve capacidade de reacção à crise – acima de tudo porque não tem indústria….a economia grega assenta no turismo e no comércio naval e os resultados estão à vista.

Portugal saiu mais rapidamente da crise em boa medida com o aumento das exportações de base industrial porque ainda assim temos um tecido industrial relevante embora frágil. E essa fragilidade tem muito a ver com a falta de robustez dos balanços das empresas e é isso que é necessário alterar para proporcionar capacidade de investimento e assegurar o futuro.

Os setores de Turismo bem como a Construção Civil e as Obras Publicas terão sempre capacidade de atração de investimento pois no caso dos dois primeiros são muito alavancados pelo mercado e têm numerosas fontes de financiamento e o Investimento Publico será sempre alavancado diretamente pela co-participação europeia nas grandes obras.
O setor industrial (e o setor agrícola igualmente…) é que necessita verdadeiramente de uma “bazuca” para alterar o seu perfil e dar um salto de competitividade tornando-se um dos motores (preferencialmente o maior motor) da economia nacional.

 
Se do ponto de vista do negócio, o ano de 2020 foi particularmente difícil, o que mudou na sua vida pessoal nestes últimos meses?
Para quem fazia viagens constantemente, estar há um ano sem viajar é estranho. O “frenesim” diário é menor, mas aumentaram as preocupações.
Há muito mais “ecrã” em todas as facetas da vida e, infelizmente,  menos contactos familiares…
 
Saudade foi a palavra eleita pelos portugueses para resumir o ano der 2020. De que sente mais saudades?

Estar com família e amigos “à vontade”…… e viajar


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