Que futuro para a indústria da moda?
Estão ainda por apurar, com detalhe, os efeitos da pandemia na economia mundial. Todos os indicadores conhecidos são motivo generalizado de preocupação. Recuo nas vendas, perdas produtivas, postos de trabalho suprimidos são apenas alguns dos sinais amargos do contágio.
O que sobra, sabendo que o mundo não para e mesmo em cenários extremos se perfilam novas oportunidades? No que se refere à moda portuguesa, de que forma se preparou para os novos desafios? Haverá uma resposta comum e integrada? Conheça os argumentos para transformar Portugal na “fábrica criativa da Europa”.
“As raízes da moda estão na Europa”. A expressão é de Luís Onofre. “Temos de saber capitalizar esse capital, aliando a nossa criatividade à capacidade de resposta das nossas empresas”, defende o Presidente da APICCAPS e da Confederação Europeia. Na mesma linha de pensamento, César Araújo, da Associação Portuguesa de Vestuário e Confeção” (ANIVEC), considera que “a indústria portuguesa é única na Europa e até ao nível mundial”. “Tem uma oferta produtiva que não se encontra em mais lado nenhum, que junta ao mesmo tempo qualidade, inovação, serviço, proximidade aos principais mercados, tanto geográfica como cultural, e responsabilidade social e ambiental”, realçou.
Fátima Santos, da Associação de Ourivesaria e Relojoaria (AORP), sublinha que “a necessidade de produzir mais perto, de criar uma economia circular na Europa, em que a procura e a oferta se aproximam, para uma resposta mais rápida e flexível às novas dinâmicas de consumo” poderá favorecer as empresas portuguesas. Acresce “uma inversão da lógica do fast fashion para uma produção assente na qualidade, design e práticas sustentáveis” e a inevitável necessidade de “criação de relações de confiança entre toda a cadeia de valor”. Em resultado, Portugal poderá diferenciar-se como “fábrica criativa da Europa, em que criação e produção se aproximam e se entreajudam”. Com efeito, “da criatividade vem a diferenciação, a capacidade de leitura do mercado e do consumidor, a antecipação de tendências. Da produção vem a capacidade de encontrar novos materiais, novos processos da materialização da visão do design”, considera Fátima Santos.
Eduarda Abbondanza recorda “a versatilidade do tecido industrial português, que o torna diversificado e atraente em termos de produção”. Acresce a existência de “centros tecnológicos e de inteligência têxtil, certificação, investigação, centros de formação técnica e ensino superior, laboratórios, gabinetes de design e protótipos, feiras e fashion weeks, somos digitais, crafters, trabalhamos com robótica e temos muitos sistemas de comunicação ativos. Temos quase tudo”. Para a presidente da ModaLisboa importa aperfeiçoar “o trabalho em rede e as colaborações, percebendo que o exercício do design é fundamental para o desenvolvimento de Moda”. Já a “sustentabilidade faz parte do nosso dia-a-dia e a estratégia de integração é fundamental, tanto a nível local como a nível de comunicação global”.
De acordo com Eduarda Abbondanza “a nossa indústria é responsável, informada, cumpridora das normas europeias de produção e de grande qualidade”. Adicionalmente, “consciente de que o preço é uma questão determinante relativa à produção, teremos de saber competir por uma produção valorizada pelos níveis de qualidade, ética, know-how, inovação e tecnologia, e compromisso”. A tudo isto resta “acrescentar que o desenvolvimento de marcas portuguesas é cada vez mais uma urgência, porque acrescenta mais-valias ao valor de produção através de uma montra do pensamento de design em constante evolução em Portugal”.
“Criatividade, inovação, competência, empreendedorismo e transparência” serão os pilares da indústria portuguesa de futuro. A tese de Mónica Neto sustenta-se no facto de que só dessa forma será “possível retomar a rota de crescimento e evolução que vínhamos trançando”. Para a responsável pelo Portugal Fashion “não haverá distância de segurança entre a inovação tecnológica e a criatividade do setor, a digitalização deixará de ser futuro, de uma vez por todas, as práticas de sustentabilidade deixarão de ser marketing ou tendência e serão finalmente condição de existência. A indústria prepara-se assim para um setor mais lento na essência, mas mais rápido na resposta ao seu cliente e ao seu consumidor e mais capaz de escalar em valor acrescentado.”
Fátima Santos acredita que “foi criada uma oportunidade para repensar os modelos de negócio e de produção e isso abre espaço a que possamos também redefinir o nosso posicionamento internacional, que navegou sempre ao fluxo do curto prazo, sem uma estratégia sustentável, imune às flutuações do mercado internacional”. César Araújo defende que “somos uma indústria com um enorme know-how não só na produção como também no desenvolvimento de produto, conseguimos trabalhar em parceria com os clientes para lhes dar aquilo que eles procuram. Não somos meros produtores, somos prestadores de um serviço de qualidade, que vai desde o design e o desenvolvimento dos protótipos à escolha dos materiais e às soluções de logística mais avançadas. Tudo num mesmo local, num raio de ação muito curto e a poucas horas de avião dos principais destinos de moda. É isso que nos torna diferentes da concorrência e que nos vai permitir ultrapassar os próximos desafios”.
Para Luís Onofre “Portugal caminha para ser o epicentro europeu no desenvolvimento de soluções sustentáveis”. “Temos competência, conhecimento articulado ao longo de gerações, que aliamos a uma capacidade de resposta rápida invulgar”.