Que futuro está reservado para a moda made in Italy?
De acordo com a McKinsey & Co., a Itália contribui com mais de 40% da produção de bens de luxo à escala internacional. Os “especialistas” italianos consideram, porém, que para poderem “assegurar uma vantagem verdadeiramente competitiva, as marcas e fabricantes italianos devem considerar a racionalização dos processos de fabricação para serem mais ágeis na resposta ao mercado”.
Realizada no Fioraio Bianchi Caffè em Milão, esta discussão foi conduzida por Chatham House Rule, não partilha declarações feitas por indivíduos ou empresas específicas, mas permite uma olhar muito atento à realidade italiana.
Integração vertical
“O ‘Made in Italy’ historicamente tem muito que ver com uma certa mentalidade - de lealdade, de prática responsável e pequenas séries de produtos”, foram alguns dos comentários na sessão de abertura. “Sempre estivemos preparados para apoiar pequenas empresas, mas a nova realidade é que o sistema está sendo monopolizado pelas grandes marcas.”
Reforço subcontratação no exterior
Por via dessa mudança de paradigma, “aumentando a pressão crescente das marcas que dominam o negócio, algumas marcas estão a tornar-se menos capazes de produzir em Itália”, obrigando a uma maior subcontratação no exterior. Os EUA são um excelente exemplo: “70 a 80% do mercado é dominado por grandes players.”
Otimização da produção
Do ponto de vista industrial, Itália terá de operar algumas mudanças nos próximos anos. “Estamos a perder muitas oportunidades de negócios ao promover exclusivamente a narrativa ‘Made in Italy’ como produtos de cariz artesanal”, disse um convidado, em detrimento de uma relação aos processos industriais de ponta. “Como sistema, precisamos de passar a mensagem de que o trabalho automatizado é excelente”.
Os jovens
De um modo geral, as marcas presentes concluíram ser muito oportuno “estimular o interesse renovado dos jovens pela indústria”.
Geração-Z
Executivos de marcas como Brunello Cucinelli, Bulgari, Gucci, Prada ou Valentino reconhecem a necessidade coletiva de rejeitar a abordagem tradicional de marketing “de cima para baixo” quando se trata de conectar-se autenticamente com os clientes da Geração Z.“Do nosso ponto de vista, abordamos o cliente da Geração Z de uma maneira totalmente diferente da nossa comunicação tradicional com a geração do milénio”, disse um dos convidados. “Anteriormente, aprimorávamos firmemente a nossa própria narrativa e imagem. Quando se trata da Geração Z, preferimos prescindir do controlo para que esses novos consumidores possam alavancar as suas narrativas ao interpretarem as nossas marcas.” “Muitos desses novos ambientes – TikTok, Discord, Snapchat – envolvem abrir mão de algum controle sobre essas comunidades. É desafiador, mas necessário, que as marcas tradicionais entreguem os seus produtos a essas comunidades.”
O fórum especializado discutiu igualmente a necessidade de testar novos canais. Há, no entanto, quem considere uma abordagem mais cautelosa: “Quando se trata de plataformas como o TikTok, precisamos de estudar e entender um pouco mais e não nos sentirmos pressionados a ter uma presença imediata”, defendeu um convidado. “Seja corajoso o suficiente para dizer não se necessário”. Outro executivo assume “uma abordagem de testar e aprender”.
Democratização da moda
De um modo geral, as grandes marcas italianas consideram fundamental “aproveitar o 'Made in Italy' como um diferencial de valor”. O advento da Internet “democratizou o acesso aos produtos”, gerando um inevitável impacto no capital cultural de diferentes marcas e negócios.
“Milhões de pessoas podem agora interagir com todas as marcas”, observou um executivo. “Neste espaço democratizado onde todos têm acesso a tudo, há que explorar o regresso ao patrimônio e ao artesanato”, argumentos que combinados podem gerar “um verdadeiro diferencial de valor.”
A educação como imperativo nacional
Também o tema da educação e da formação profissional preocupa os líderes da moda italiana.
“À medida que todas as nossas empresas exploram novas fronteiras, nomeadamente no universo digital, precisamos de instituições – escolas de ensino médio – para formar as novas gerações”.
“Não temos a educação certa neste campo”, concordou outro participante. “Precisamos de dados e precisamos de analistas de dados. E a faculdade é tarde demais – deveríamos estar equipando as crianças em idade escolar para entender o metaverso, para poder humanizar os dados – essas são qualidades que são tão críticas quanto o artesanato e o savoir faire italiano.”
“É preciso haver incentivos financeiros também. A realidade é que um alfaiate-chefe que aprende o ofício em Itália pode ganhar mais de 100 mil euros por ano”, acrescentou outro convidado. “Precisamos fazer com que os jovens voltem a sonhar com esses empregos.”
De acordo com Giovanna Ceolini, nova presidente da Assocalzaturifici, "o setor como um todo mostra uma recuperação significativa”, ainda que seja “afetado pelos custos de energia e matérias-primas e pelo conflito russo-ucraniano, que põe em risco a recuperação no curto prazo". “Estamos particularmente agradados com a retoma das vendas nos mercados norte-americanos e nos principais países da União Europeia”.
Numa analise mais detalhada relativamente aos dados de comércio externo nos primeiros cinco meses do ano, as exportações italianas de calçado cresceram 24% em valor e 15% em quantidade em relação ao período homologo do ano anterior. Este desempenho permitiu inclusivamente “superar os números anteriores à pandemia”. No entanto, é significativo que o setor de calçado de couro, que tradicionalmente o mais forte para o setor italiano, ainda esteja bem abaixo dos volumes de vendas externas de 2019 (quebra de 10,5% em relação a janeiro-maio de 2019). Por destinos de exportação, destaca-se a União Europeia (crescimento de 23% em valor), impulsionada fundamentalmente pelos acréscimos em pela França e na Alemanha (os dois principais mercados externos do calçado italiano). Igualmente relevante é o crescimento sustentado nos Estados Unidos e Canadá (cerca de 65% em valor). Outro mercado em crescimento foi o Extremo Oriente (+15% em valor); enquanto na China há a assinar uma forte desaceleração nos meses de abril e maio, onde ser registam quedas significativas nas exportações (na ordem dos 25%).
O primeiro semestre do ano fica ainda marcado pelo encerramento de 95 empresas italianas de calçado. Já o emprego apresentou um número positivo, com 1.062 postos de trabalho criados entre janeiro e junho deste ano. De acordo com a Assocalzaturifici “esta recuperação do emprego ainda é insuficiente para recuperar todo o emprego perdido durante a pandemia”.