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Rússia: um mercado de oportunidades

Rússia: um mercado de oportunidades

26 Jul, 2021

* artigo publicado a 26 de julho de 2021

Entrevista a Nuno Lima Leite, delegado da AICEP em Moscovo


A AICEP, em parceria com a APICCAPS, realizou no passado dia 7 de julho, um webinar dedicado ao setor do calçado no mercado Russo, no âmbito do programa “Em Foco”. A conferência virtual contou com a participação do diretor-geral da APICCAPS, João Maia e do delegado da AICEP na Rússia, Nuno Lima Leite, bem como com a participação de Iraida Molodtsova, importadora russa e especialista no sector calçado e de Fernando Barbosa, empresário importador e distribuidor de calçado português na Rússia.

O webinar teve como objetivo evidenciar as melhores abordagens para as empresas que estão e/ou pretendem começar a exportar para o mercado russo, bem como as oportunidades de negócio para as empresas portuguesas, atendendo ao contexto macroeconómico, tendências e perspetivas do mercado russo.  

O mercado russo é de elevado potencial para as empresas portuguesas de calçado. Atualmente, o calçado faz parte dos bens mais comprados pelos russos, com uma média de compra de 2 a 6 pares de calçado por ano.

Para João Maia, diretor-geral da APICCAPS, a Rússica é um mercado de oportunidades. “As empresas portuguesas têm a capacidade de exportar e estão mais do que preparadas para abordar o mercado russo”, que é atualmente o 12º maior importador mundial do calçado.

Segundo as estatísticas do “The Moscow Times”, com o impacto económico (covid) o EBITDA das empresas caiu 23,5% em 2020 face a 2019 e consequentemente assistiu-se a um decréscimo do PIB de 3% em 2020. No entanto, apesar da quebra significativa, estima-se um crescimento de 3,2% em 2021 e 2022.

Nuno Lima Leite, delegado da AICEP na Rússia, refere também que o aumento do consumo em 19%, entre 2016 e 2020, bem como o aumento das suas importações em 4,65% apontam perspetivas favoráveis para o setor do calçado.
A sessão contou ainda com o testemunho dois representantes de duas marcas portuguesas na Rússia. Fernando Barbosa empresário importador e distribuidor de calçado português na Rússia, com a marca Carlos Santos e Iraida Molodtsova, importadora russa e especialista no sector calçado com a marca Fly London.

Entrevista a Nuno Lima Leite, delegado da AICEP em Moscovo

De que forma tem evoluído o mercado russo?
Na Rússia, a indústria da moda começou a desenvolver-se apenas nos 1990. A extinção da União Soviética deu início ao renascimento do mercado nacional da moda que tinha permanecido “congelado” ao longo de várias décadas por razões ideológicas ligadas à rejeição dos valores materiais, do luxo e do culto do consumo e levando à restrição das importações de produtos de moda ocidentais. O desenvolvimento do mercado russo da moda teve um caráter espontâneo. Primeiro, apareceram as boutiques de marcas de luxo (Versace, Chanel, Gucci, JilSander, Ermenegildo, além de outras representadas pela Casa Comercial “Moskva), às quais se seguiram as marcas de gama média como Benneton e Mango. Porém, esta missão foi mal interpretada: as pessoas não entravam nas boutiques de luxo cuja abertura as assustava em vez de as atrair. Assim, possuir uma boutique de marcas de luxo mais era uma questão de prestígio do que um negócio rentável. Com o tempo, porém, a indústria da moda sofreu transformações consideráveis, traduzidas no crescimento do número de boutiques multimarcas e monomarca, na realização periódica, principalmente semestral, de saldos, na rentabilização do negócio da moda. A Rússia foi-se transformando num dos maiores mercados emergentes da moda internacional. No entanto, até ao início dos anos 2000 permaneceu completamente dominado por fabricantes estrangeiros. A maioria dos produtos de moda era importada dos países europeus, com destaque para a Itália, Alemanha e França. O início do terceiro milénio foi marcado pelos primeiros passos dados pela indústria nacional para a sua afirmação e pelo nascimento das primeiras marcas nacionais de moda. O consumo médio de calçado na Rússia tem-se mantido, desde 2015, ao nível de 2 pares per capita por ano

No entanto, apesar do mercado russo de vestuário e calçado tem sido dos mais dinâmicos, com o inicio da pandemia COVID no 1º semestre de 2020 observou-se um impacto sobre todos os atores do mercado russo de calçado. Neste período, verificou-se uma nítida tendência para uma evolução negativa do mercado, quer em volume, quer em valor com a diminuição dos rendimentos disponíveis da maioria dos russos. Alem disso, com a pandemia global, a adoção do regime de confinamento e o aumento do desemprego têm levado a população a cortar nas suas despesas com bens de grande consumo, nomeadamente o calçado.

No 1º semestre de 2020, o mercado russo de calçado era estimado em 170,2 milhões de pares em volume. A maior quota de mercado é detida pelo calçado feminino (47%), seguido pelo masculino (35%) e infantil (18%).     

Atualmente, o calçado faz parte dos bens comprados pelos russos com relativa frequência. Em média, o consumidor russo compra 2 a 6 pares de calçado por ano. Mais de 50% das pessoas compram 2 a 3 pares por ano e cerca de 30% - 4 a 6 pares. As mulheres compram calçado mais frequentemente do que os homens: em 2019, a quantidade de 4 a 6 pares de calçado foi adquirida por 29,5% das mulheres e por 12,4% dos homens. A maior parte dos homens (64,9%) comprou não menos de 2 a 3 pares.  

Além disto, tem-se verificado uma tendência para os consumidores se tornarem mais atentos, exigentes e críticos em relação ao binómio preço-qualidade das mercadorias. Consequentemente, a sua atenção volta-se cada vez mais para as marcas de vestuário e calçado que, sendo económicas, não deixam de ter qualidade. Como tal, a notoriedade de uma marca deixa de ser um critério decisivo.  A Rússia moderna sempre foi exigente em questões de design. As tendências mudam constantemente e as pessoas, em particular as senhoras, procuram acompanhar de perto a moda. Os russos são extremamente sensíveis ao belo.  

Um segmento que beneficia atualmente de procura generalizada é o vestuário desportivo informal. As vendas de sapatos de saltos altos são hoje metade do que eram há 5 a 6 anos. A moda desportiva, a “das sapatilhas”, está em expansão. As ofertas do mercado convergem com as necessidades do consumidor. O mundo circundante é rápido, dinâmico e multifacetado. Está na moda um modo de vida saudável e do movimento. Daí as novas exigências impostas ao calçado que deverá ser confortável, discreto, polivalente e esbatem-se as fronteiras entre o calçado para trabalhar e o calçado para lazer.  

Destacam-se os seguintes cinco critérios mais relevantes de escolha: preço (83,6%), qualidade do produto (81,6%), modelo e feição (73,4%), comodidade (66,0%), materiais naturais (40,1%). Assinala-se uma diferença de abordagens entre homens e mulheres: estas últimas privilegiam tais critérios como preço, modelo, comodidade da forma e estilo juvenil. Inversamente, os critérios que interessam sobretudo os homens são tipo de material (deve ser couro), peso, país de fabrico e notoriedade da marca.  De notar que os russos de 25 a 35 anos preferem calçado fabricado de materiais naturais, enquanto os consumidores de 16 a 24 anos dão mais importância ao modelo, ao estilo juvenil do calçado e prestam um tanto maior atenção ao preço.

Que perceção se tem do calçado português a partir da Rússia?


O calçado português é tradicionalmente apreciado na Rússia desde a época soviética. As pessoas de idade avançadas referem-se com entusiasmo aos sapatos que “duravam anos”. Os fabricantes portugueses seguem-se aos italianos em termos de volume de produção e “cultura da qualidade” e ultrapassam-nos em rácio preço/qualidade no segmento de gama média, oferecendo preços aproximadamente 15% mais baratos). É por esta razão – boa relação preço/qualidade – que o consumidor russo escolhe calçado português. Isto torna a Rússia, para os fabricantes portugueses, um mercado com fortes perspetivas de crescimento.    

Na Rússia, o calçado português, de homem e de mulher, tem vindo a ganhar notoriedade nos últimos 10 a 15 anos, conquistando muitos apreciadores. Além da durabilidade, o calçado português de couro é apreciado pelo seu elevado grau de conforto. O couro português é extremamente macio, o que é fácil de verificar, comprando um par de sapatos portugueses.  

Especialistas russos admitem que num futuro recente o calçado português possa vir a igualar o italiano em termos de procura e mesmo ultrapassá-lo no segmento de gama média. Na Rússia, a procura de calçado português mantém-se estável pela sua reputação de excelente qualidade.  

No entender do consumidor russo, uma grande vantagem do calçado português reside em ser fabricado em Portugal, em pequenas e médias empresas com história própria e técnicas tradicionais de fabrico. A produção de calçado em pequenos lotes permite conservar um elevado nível de qualidade e a forte concorrência aliada ao facto de 90% dos produtos se destinarem à exportação permite manter os preços dentro dos limites razoáveis.

Os consumidores russos consideram que o calçado português distingue-se por um design sóbrio e pela combinação de elementos de moda com os cânones de fabrico de calçado clássico. Como tal, a notoriedade do calçado português na Rússia cresce de ano para ano. O sucesso das marcas FlyLondon e Portania são claros exemplos disso.

Que oportunidades se vislumbram para as empresas portuguesas?
A Rússia tem a 7ª maior população do mundo, com aproximadamente 147 milhões de habitantes, cerca de 80% dos quais habitam na parte europeia do país. A cidade e o Oblast de Moscovo contam com um total de 20 milhões de habitantes. São Petersburgo é a segunda cidade mais populosa da Rússia, com cerca de 5 milhões de habitantes. Para além destas duas metrópoles, existem outras 13 cidades com mais de 1 milhão de habitantes.

O mercado russo de vestuário e calçado é fortemente fragmentado, no qual operam praticamente todas as grandes marcas internacionais do retalho de moda. Apesar da difícil situação económica, no mercado entram novas marcas nacionais e estrangeiras. Cerca de metade das novas marcas internacionais que surgiram no mercado russo entre 2015 e 2018 pertencem ao segmento de gama média. Há que, aliás, ter em conta a hipótese de marcas que no seu país de origem pertenciam ao segmento de gama baixa poderem subir ao de gama média ao entrarem no mercado russo devido à diferença de níveis de rendimento das respetivas populações.

Mais de um terço dos russos (34%) dão preferência a marcas estrangeiras na aquisição de calçado.  
A Rússia é um mercado fortemente concorrencial, pelo que as empresas portuguesas devem adaptar a sua estratégia a este mercado específico e ter em consideração algumas recomendações para assegurarem o sucesso no mercado.

Aconselhamos as empresas antes de tentarem entrar no mercado russo, e de modo a reduzir o risco, é fundamental fazerem pesquisa de mercado, de modo a obter market intelligence que permita conhecer as suas especificidades, necessidades e tendências.

A abordagem ao mercado deve ser feita, preferencialmente, em russo. O inglês não é uma língua correntemente utilizada e outros idiomas como o alemão, francês ou espanhol são pouco falados. Tendo em conta que muitos decisores locais falam unicamente russo, a elaboração de uma apresentação em russo (p.e. um Power Point) sobre a empresa, os seus produtos e marcas é importante.

A participação ou a visita a feiras do setor de calçado é determinante como primeiro contacto com o mercado, quer para dar visibilidade aos produtos, quer para conhecimento direto dos players do setor e de potenciais parceiros. A identificação de um parceiro credível, bem relacionado e com um bom conhecimento do setor é decisiva para evitar dificuldades e ajustar a abordagem ao mercado. Permite usufruir da sua experiência de importação de vários países fornecedores da Rússia, do seu conhecimento sobre a rede de distribuição e dos meios logísticos necessários e do seu acesso a uma vasta rede de contactos (alfândegas, institucionais, administrativos).
 
* artigo publicado a 26 de julho de 2021

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